O fim da tarde mergulhava o prédio dos Titãs em um tom alaranjado suave, filtrado pelas grandes janelas de vidro que refletiam o brilho do sol poente. Lá fora, a cidade se movia como sempre — barulhenta, viva, imprevisível — mas lá dentro, havia uma calmaria estranha, quase inédita.
Dick Grayson estava recostado no sofá da sala comum, os cotovelos apoiados nas pernas, observando o ambiente em silêncio. Pela primeira vez em muito tempo, não havia gritos, alarmes, nem o som de portas sendo arrombadas ou explosões à distância. Apenas… vida.
Gar e Rachel discutiam algo bobo sobre o filme que passava na TV, cada um tentando convencer o outro sobre quem tinha o pior gosto cinematográfico. Kory estava na cozinha, rindo alto enquanto queimava algo que provavelmente deveria ser comida, e Tim digitava rápido em seu laptop, murmurando coisas sobre “melhorar o sistema de segurança da torre”.
Dick apenas observava. Um sorriso quase imperceptível surgiu no canto dos lábios. Era caótico. Era barulhento. Mas era casa.
Ele se recostou no sofá, respirando fundo. O uniforme de Asa Noturna estava guardado — não trancado, mas posto de lado, como se o próprio herói tivesse tirado uma folga. Os ombros relaxaram, e a tensão constante em sua mandíbula, que parecia parte de quem ele era, simplesmente… desapareceu por alguns instantes.
Por tanto tempo, ele carregou o peso de ser o líder, o protetor, o cara que precisava manter tudo sob controle — o que não podia falhar, nem se permitir sentir. Mas ali, naquele momento simples, ele percebeu o quanto tudo havia mudado.
Esses jovens, que ele havia reunido no meio do caos, agora riam juntos como irmãos. E ele, que passou metade da vida tentando se afastar de qualquer ideia de “família”, agora se via cercado por uma.
O riso de Kory ecoou pelo salão e o fez olhar para ela — o jeito como sua energia iluminava o ambiente sempre o deixava sem palavras. Gar jogou uma almofada em Rachel, que revidou com um olhar que fez o objeto se incendiar brevemente antes de sumir em fumaça. Tim soltou um “wow” baixo e fingiu que não viu nada.
Dick soltou uma risada curta, balançando a cabeça. Era o tipo de confusão que, há alguns anos, o deixaria exasperado. Agora, era o tipo que ele não trocaria por nada.
Pegou o controle remoto e aumentou o volume da música que tocava ao fundo — algo leve, uma batida que contrastava com o costumeiro clima tenso das missões.
— “Vocês não sabem o que é descanso até me verem assim,” — ele disse, num tom descontraído, jogando a cabeça para trás.
Rachel revirou os olhos. Gar sorriu. Kory, da cozinha, respondeu sem olhar: — “Aproveite enquanto pode, Grayson. A paz nunca dura muito com a gente.”
Dick sorriu de novo, desta vez de verdade. Ela estava certa. Não duraria. Mas, por agora, estava tudo bem.
Ele olhou ao redor, sentindo o calor do ambiente, o som do riso, o conforto de não estar sozinho. E pela primeira vez em muito tempo, não se sentiu o substituto de ninguém — nem o reflexo de Bruce, nem o herdeiro de um legado.
Era apenas Dick Grayson. E aquela era sua família.