O pôr do sol em Hawkins tinha um ar pesado desde o dia em que o mundo quase se partiu ao meio. Mesmo depois da derrota de Vecna, nada parecia realmente voltar ao normal. O ar era diferente — mais frio, mais denso — e Steve Harrington sentia isso em cada respiração.
O silêncio da cidade o incomodava. Ele nunca fora um cara que gostava de pensar demais, mas ultimamente, pensar era tudo o que fazia.
A casa onde morava estava quase vazia, exceto por um ventilador barulhento e o tilintar suave do gelo dentro de um copo. Steve estava sentado na mesa da cozinha, o cabelo bagunçado, o olhar fixo em um amontoado de anotações, recortes de jornal e fotos borradas. Eram pistas — ou, talvez, só coisas que ele queria que fossem pistas.
Robin tinha dito para ele descansar. Dustin insistira que tudo estava bem. Mas Steve não acreditava. Ele sabia que aquilo ainda não tinha acabado.
Naquela noite, as palavras de Eddie ecoavam na cabeça dele — o riso nervoso, o jeito debochado que o garoto usava pra esconder o medo. Eddie estava vivo, sim, mas… mudado. Todos estavam.
Steve tamborilava os dedos na mesa, o som seco marcando o ritmo do pensamento. “Nova ameaça”. Era o que eles chamavam agora. Ninguém sabia o que era, de onde vinha ou quando viria. Só sabiam que algo os observava.
Ele se levantou, pegou a lanterna e a jaqueta jeans, e foi até a sala. O velho taco de beisebol com pregos — o mesmo que o acompanhara nas noites mais insanas da vida — ainda estava encostado na parede. Steve o segurou por um momento, os olhos parando nas marcas do metal e nas lascas da madeira. Quantos monstros ele já tinha enfrentado com aquilo? Quantas vezes achou que seria a última?
O relógio marcava quase meia-noite quando ele saiu. A rua estava deserta, o vento frio levantando poeira e folhas mortas. Hawkins dormia, mas Steve não conseguia. Não desde que o portal se abriu pela última vez.
Caminhou até o carro, o som dos passos ecoando no asfalto molhado. Antes de entrar, olhou para o céu. Nenhuma estrela. Nenhum som.
— “Tá tudo bem, Harrington. Tá tudo bem.” — murmurou, tentando se convencer.
Mas no fundo, ele sabia: não estava tudo bem. E nunca mais estaria.
Sentou-se no banco do motorista, respirou fundo e ligou o carro. As luzes dianteiras cortaram o breu da estrada, e ele acelerou em direção ao campo onde o mundo dos vivos e o dos mortos já haviam se tocado.
No rádio, uma música antiga começou a tocar — uma daquelas que costumava dançar com Nancy, anos atrás. Steve sorriu de canto, cansado.
— “Sabe, Buckley… talvez eu seja mesmo o cara que nunca aprende a parar de tentar.”
E, sozinho na escuridão, o som do motor misturou-se ao vento, enquanto ele dirigia em direção ao desconhecido mais uma vez — o herói improvável de uma cidade que nunca deixava de sangrar.