O silêncio da Mansão Wayne era diferente à noite. Não era o tipo de silêncio tranquilo que acompanhava casas grandes demais e cheias de memórias — era um silêncio vivo, pulsante, quase consciente. Um silêncio que parecia observar.
Bruce Wayne caminhava pelos corredores com passos lentos, as mãos enfaixadas, o corpo coberto apenas por uma camiseta preta simples e calças de treino. Havia marcas recentes em seus braços, pequenos cortes e hematomas escondidos pela sombra — lembranças da última noite nas ruas de Gotham.
A mansão estava escura, exceto pela luz que vazava do escritório, onde o relógio antigo escondia o caminho para a Batcaverna. Mas, por hoje, ele ainda não iria descer. Por hoje, precisava respirar.
Ele se aproximou da janela, o olhar perdido na escuridão que se estendia além dos portões. Gotham dormia, ou fingia dormir, e Bruce observava, como sempre fazia. O reflexo no vidro devolvia a imagem de um homem que já fora muitas coisas — órfão, herdeiro, justiceiro, lenda — e que, no fundo, já não sabia mais qual dessas identidades era a verdadeira.
Um trovão ecoou ao longe, e a chuva começou a cair, fina e ritmada. Bruce deixou que o som preenchesse o espaço, um raro conforto. Os olhos, porém, se desviaram para a mesa ao lado. Sobre ela, uma foto antiga: ele, Dick, Jason e Alfred. Um momento raro de calma, de algo que um dia se pareceu com felicidade.
Os dedos tocaram a moldura. Por um instante, o homem que enfrentava deuses e monstros pareceu frágil. Não pelo peso da dor física — essa ele sabia suportar — mas pelo eco de tudo o que havia perdido tentando salvar o que amava.
Ele se afastou da janela, caminhando até a poltrona de couro próxima à lareira apagada. Sentou-se. O corpo afundou no assento, pesado, exausto. Mas a mente… a mente seguia desperta.
Bruce abriu um pequeno caderno de anotações — letras precisas, organizadas, quase frias. Cada página era um lembrete do controle que ele precisava manter. Novos nomes, novas ameaças. Uma rotina que nunca acabava.
Ainda assim, ali, sozinho, sem a máscara, sem a armadura, o Batman parecia mais humano do que nunca.
Os olhos se fecharam por um momento. O som da chuva. O cheiro da madeira antiga. O peso do silêncio.
E quando os olhos se abriram de novo, ele sussurrou algo tão baixo que a própria mansão pareceu escutar: — “Eu prometi, pai… Ainda tô tentando.”
O relógio no corredor marcou a meia-noite. Bruce levantou-se devagar, respirou fundo e caminhou até o escritório. As mãos, firmes apesar do cansaço, giraram o ponteiro do relógio.
O som do mecanismo se moveu, revelando a passagem secreta. A escuridão o aguardava.