O mundo parecia o mesmo — mas não era. O céu tinha o mesmo tom de cinza sujo que ele lembrava, o vento trazia o mesmo cheiro de ferro, gasolina e caos, mas Logan sentia, no fundo do peito, que nada ali lhe pertencia. O ar do universo de Wade Wilson tinha algo… deslocado. Como se cada som, cada sombra, estivesse rindo de alguma piada que ele não entendia.
Ele caminhava pela estrada deserta, o sobretudo rasgado balançando contra o vento. Atrás dele, a poeira levantava em redemoinhos lentos, e no horizonte, o letreiro torto de “X-Mansion” se erguia — enferrujado, meio destruído, mas ainda de pé.
Por um instante, Logan parou e observou. Aquilo não podia ser real. Ele lembrava da última vez que vira aquele lugar — em ruínas, vazio, silencioso. Agora, o que via era diferente: janelas iluminadas, vozes ao longe, risadas. A mansão viva. A equipe viva.
Os X-Men… vivos.
Um nó se formou na garganta dele. Não de emoção — de confusão, de dor. Ele não sabia o que era mais difícil de aceitar: o fato de estar ali, ou o fato de saber que o “ele” daquele universo não existia mais.
O antigo Logan. Aquele que morrera protegendo a garota, que deixara o nome “Wolverine” descansar junto com ele. E agora, ele — um homem de outro tempo, outro mundo, outro inferno — estava ali para ocupar o lugar que não era seu.
Ele deu o primeiro passo em direção à mansão. O peso das botas afundava no solo molhado, e cada passo parecia mais pesado que o anterior. No fundo da mente, o grito de Wade ainda ecoava — as piadas, a forma como ele o empurrou pra dentro desse mundo com aquele sorriso irritante e, de algum jeito, sincero.
“Confia em mim, Logan. Esse lugar precisa de você. E você… talvez precise dele.”
Logan quase riu. O Deadpool dizendo isso — o mesmo sujeito que transformava qualquer tragédia em piada — e, ainda assim, talvez… estivesse certo.
Ele parou diante da porta principal. O som das vozes era claro agora — reconhecíveis. Jean. Ororo. Scott. Até Hank. Por um instante, ele fechou os olhos, e o coração apertou. Essas vozes pertenciam a um tempo em que ele ainda acreditava em recomeços.
A mão dele foi até o trinco da porta, mas hesitou. Entrar significava assumir aquele papel. Ser o Logan daquele mundo. O mentor, o soldado, o monstro domesticado.
Ele respirou fundo. A cicatriz no peito ardeu — um lembrete de que ele ainda estava vivo. Que, de alguma forma, o destino decidira que ele merecia mais uma volta nesse ciclo.
A porta se abriu devagar, rangendo. A luz cálida do interior da mansão o envolveu, e por um segundo ele viu — os rostos, os uniformes, os olhares de surpresa. Jean o encarando com incredulidade, Scott com tensão, Hank com aquele brilho científico curioso.
E todos, por um instante, calados. Como se o fantasma de um homem tivesse acabado de atravessar a porta.
Logan os olhou em silêncio. O cigarro entre os dedos tremia levemente, mas ele o levou à boca mesmo assim. Tragou, soltou a fumaça e, com a voz rouca e baixa, quebrou o silêncio:
— “Tô de volta, pelo visto.”
Ninguém respondeu de imediato. Mas Jean deu um passo à frente, o olhar misto entre confusão e ternura.
Logan desviou os olhos. Ele não queria ver o reflexo do outro em cada rosto — o outro ele, o que eles amaram, o que eles perderam. Mas sabia que era inevitável.
Enquanto avançava pelo saguão, a lembrança do passado começou a se misturar com o cheiro do presente. Café quente, metal, couro. Tudo tão familiar que doía.
Ele sabia que esse mundo não era o seu. Mas ali, entre fantasmas que respiravam e memórias que riam, ele percebeu algo que não sentia há anos — um eco de pertencimento.
E mesmo que não tivesse certeza se merecia aquilo, Logan ficou. Porque, talvez, essa fosse sua última chance de consertar o que o tempo destruiu. Ou, pelo menos, de morrer tentando outra vez.