O silêncio da Mansão X nunca parecia pesar tanto quanto naquela noite. Logan estava sozinho no corredor, um copo de uísque quase intocado na mão, a cabeça baixa e os olhos fixos no chão de madeira. O eco distante de passos de alunos e vozes abafadas parecia vir de outro mundo — o dele estava preso numa espiral de lembranças que se repetiam como uma ferida aberta.
Jean. O sorriso suave dela, o toque que ele nunca deveria ter permitido que fosse além de uma amizade, o fogo que ardia nos olhos dela quando os dois se aproximavam. Logan fechou os olhos e inspirou fundo, o cheiro de uísque se misturando ao da mansão. Tudo nele gritava que aquilo não era apenas um erro — era uma traição. Não a Jean, mas ao homem que ele respeitava, mesmo que a rivalidade entre eles fosse como lâminas afiadas em combate: Scott Summers.
Com um suspiro pesado, Logan deixou o copo sobre a mesa e passou a mão pelo rosto, como se pudesse apagar da pele a marca da culpa. Ele nunca se deu ao luxo de carregar arrependimentos por muito tempo — sempre empurrava tudo para o fundo da mente, afogava em álcool ou enterrava em batalhas. Mas Scott não era apenas mais um colega. Ele era o líder, o cara que sempre carregava o peso da equipe, e Logan sabia, no fundo, que tinha cruzado uma linha que não podia ser apagada.
“Você é melhor do que isso”, murmurou para si mesmo, a voz grave arranhando o silêncio.
Levantou-se devagar, os passos pesados pelo corredor, indo em direção ao escritório onde sabia que Scott passava boa parte das noites. Logan parou diante da porta fechada, a mão suspensa no ar, hesitando antes de bater. Os nós dos dedos cerraram, as garras quase surgindo por reflexo, como se o corpo inteiro dele lutasse contra o impulso de se expor. Ele não tinha medo de ninguém — mas ali, parado diante daquela porta, a sensação era de vulnerabilidade pura.
Não bateu. Apenas encostou a mão no batente, a respiração pesada, os olhos fechados. A mente trabalhava em silêncio, pensando em como começar, em que palavras poderiam ser ditas. Não havia desculpa, não havia justificativa que realmente limpasse a ferida que ele mesmo tinha aberto. Tudo o que restava era tentar mostrar, com ações, que não era apenas o animal selvagem que todos viam.
Logan recuou um passo, respirou fundo e forçou-se a seguir em frente, passando pelo corredor e descendo as escadas em direção à sala de treinamento. Se não podia pedir desculpas em palavras, mostraria em disciplina. Se não podia apagar a dor que causou, se redimiria da única forma que sabia: protegendo a equipe, carregando parte do peso que Scott sempre levava.
Entrou na sala escura, acendeu as luzes e ativou os simuladores. A sala de treinamento ganhou vida ao redor dele, hologramas surgindo, inimigos digitais se preparando para atacar. Logan não esperou o sistema terminar o protocolo: avançou contra eles com brutalidade, garras brilhando, músculos tensos, golpes certeiros. Cada investida era um desabafo, cada corte uma tentativa de apagar da pele e da consciência a marca da traição.
O suor escorria, o peito arfava, mas ele não parava. Quanto mais lutava, mais lembranças vinham — Jean sorrindo, Scott confiando nele em batalha. Logan rugiu, um som gutural, selvagem, mas carregado de frustração. Derrubou o último inimigo simulado com um golpe violento, o holograma desaparecendo em faíscas. Ficou parado no centro da sala, ofegante, os punhos cerrados, o corpo inteiro tremendo de tensão.
Sozinho, no silêncio que voltou a dominar a sala, Logan ergueu o olhar para o teto e murmurou:
— “Eu vou fazer melhor… Scott. Vou fazer melhor.”
A voz saiu rouca, quebrada, mas firme. Não era uma promessa dita a outro homem, mas a si mesmo. A única forma que conhecia de se redimir era seguir lutando — não por ele, não pela culpa, mas pelo time. E, principalmente, por Scott, o único que ele nunca deveria ter ferido.