O líder observa o porão tomado pelo silêncio. As velas ardem baixo, cuspindo fumaça negra que impregna as paredes como se fosse mofo vivo. O círculo, rabiscado em sangue coagulado e sal grosso queimado, pulsa como se tivesse um coração próprio.
Ele está de pé no centro, vestindo apenas um manto rasgado, salpicado de sangue seco de rituais passados. Não há nervosismo em seus olhos. Há apenas uma calma perturbadora, quase paternal, como se estivesse prestes a ensinar uma lição.
Com passos lentos, aproxima-se da vítima acorrentada. O rapaz chora, mas o líder não escuta lágrimas — ele escuta música. Seus dedos deslizam pelo pescoço da presa, sentindo o pulso acelerar.
— “Escutem… vocês ouvem?” — ele pergunta aos demais cultistas, que observam em silêncio. — “Cada batida é um tambor. Cada gemido é um cântico. A dor é a língua que eles compreendem melhor.”
Ele ergue a lâmina. Não crava. Em vez disso, pressiona contra a pele com precisão cirúrgica, deixando que o corte se abra devagar. O sangue escorre quente, grosso, vermelho vivo. O líder mergulha o polegar no líquido e pinta o próprio rosto, marcando cruzes invertidas nas pálpebras, um sorriso grotesco em sua boca.
— “Eu não peço tronos, não peço ouro…” — sussurra, lambendo o sangue. — “O que ofereço é espetáculo. Um ato puro, livre de egoísmo humano. Somente a verdade nua da dor.”
A vítima tenta gritar, mas o arame farpado em sua boca só rasga os lábios ainda mais. O som abafado ecoa pelo porão, um soluço metálico. O líder sorri.
Ele volta-se para o círculo e ajoelha-se dentro dele. Mergulha as mãos no sangue acumulado e deixa que pingue de seus braços, molhando o chão como se fossem rios carmesins. Seus olhos se fecham, o corpo arqueia para trás.
— “Lúcifer… portador da rebelião. Lilith… mãe da desobediência. Não venho pedir. Venho mostrar. Venho lhes provar que somos feitos à sua imagem: cruéis, insaciáveis, psicopatas por natureza. Eis minha obra. Eis minha tela.”
As velas tremem violentamente. As sombras se alongam até parecerem criaturas retorcidas presas às paredes. O círculo brilha, não em vermelho, mas em negro profundo, como se engolisse a própria luz.
O líder ergue os braços, ensanguentados, e ri. Sua risada é baixa no início, mas cresce, ecoando pelo porão como gargalhada demente. Ele não teme. Ele deseja ser visto. Deseja ser devorado.
— “Venham! Sejam testemunhas daquilo que criei em vosso nome! Se querem minha carne, tomem-na! Se querem minha alma, dilacerem-na! Mas que vejam: eu também sei rir enquanto o mundo queima!”
O ar torna-se pesado, difícil de respirar. Os outros cultistas se encolhem, mas o líder permanece firme. O corpo da vítima começa a se contorcer, os olhos virando em branco, a voz rompendo o silêncio com gritos que não pertencem a humanos.