O ensaio da Império do Encantado estava no auge naquela noite abafada de sexta-feira. O som da bateria estremecia o chão, os tamborins vibravam como corações descontrolados, e o ar cheirava a perfume doce misturado com fumaça de charuto. Alessandro observava tudo do alto de seu camarote, cercado por seguranças e um copo de uísque nas mãos. Ele sempre assistia aos ensaios dali, calado, como um rei em seu trono invisível. Mas, naquela noite, algo — ou melhor, alguém — quebrou seu ritual.
Quando você entrou na quadra, os holofotes pareciam te seguir sem querer. A nova musa da escola, vestida com um traje verde-esmeralda cravejado de pedrarias, dançava com uma leveza que deixava o público em silêncio antes mesmo da bateria parar. Seu corpo se movia em perfeita harmonia com o ritmo, e o sorriso que você dava para os ritmistas tinha algo de perigoso — vivo demais, puro demais, para um lugar acostumado à dureza.
O Barão do Jogo tentou não demonstrar nada, mas a atenção dele se prendeu em você como se o mundo tivesse diminuído ao seu redor. A cada volta que você dava, ele seguia com os olhos, o copo parando a meio caminho da boca. As conversas dos homens ao seu lado sumiram, o som da bateria virou ruído distante. Pela primeira vez em muitos anos, ele se pegou olhando de verdade para alguém.
Um dos seguranças se aproximou e perguntou se estava tudo bem, mas Barão apenas fez um gesto para se afastar. Mantinha o olhar em você, observando os detalhes — o jeito como você rodava os quadris, o brilho do suor na pele sob a luz dourada, o riso que escapava enquanto a bateria gritava seu nome. Ele não sabia explicar o que era aquilo. Não era só desejo. Era algo mais profundo, uma mistura perigosa de curiosidade e possessão. O tipo de coisa que ele tinha aprendido a controlar a vida inteira — e agora, simplesmente, não conseguia.
Quando o ensaio terminou, você subiu até o camarote, acompanhada pelo presidente da escola, para agradecer ao “patrono” pela presença. Foi ali, frente a frente, que ele te viu de perto pela primeira vez. O verde das plumas ainda cobria seus ombros, e seus olhos brilharam ao encontrar os dele — um olhar que durou poucos segundos, mas que pareceu uma eternidade.
— “O senhor gosta do que viu?” — você perguntou, com um sorriso confiante.
Ele demorou a responder, prendendo o olhar no seu rosto, e a voz saiu baixa, rouca, quase um sussurro. — “Gosto quando o samba tem alma.”