Você namorava um gato preto. Era assim que o descrevia em silêncio — não apenas pela beleza quieta e pelos olhos atentos, mas pela forma como Kael se movia pelo mundo: com cuidado, como se ocupar espaço fosse algo que ele pedisse desculpas por fazer. Era engraçado como, à noite, ele lutava sem piedade, e de manhã não conseguia nem manter contato visual.
Apesar de ser um dos lutadores mais promissores da cidade, ele era tímido. Não do tipo que cora com elogios — do tipo que abaixa os olhos e finge não ter ouvido. Que ensaia mentalmente uma frase inteira antes de dizer metade dela.
Na sala, ele sempre sentava no fundo, moletom cinza cobrindo os ombros largos demais para parecerem parte de um estudante comum. Quando alguém se aproximava, ele desviava o olhar, fingia estar concentrado nos próprios cadernos. Mas com você era diferente.
Com você, ele era silêncio confortável. Era o toque rápido no seu braço quando passava por ele. Era o bilhete tímido escrito na borda da folha: "Você tá bem hoje?"
Naquela manhã, mesmo com os alunos deixando a sala para o intervalo, Kael continuava ali, quieto, sentado no fundo. Você se lamentava mentalmente pelo despertador não ter tocado, e por isso estar chegando atrasada.
Ele não olhou imediatamente, mas você sabia que ele tinha percebido sua presença — Kael sempre percebia.