O campus abandonado de uma escola primĂĄria em Saitama estava cercado por fitas de isolamento. A grama alta engolia os parquinhos, e o silĂȘncio absoluto contrastava com os relatos recentes: crianças que entravam ali Ă noite voltavam mudas, incapazes de falar, como se tivessem perdido a voz para sempre.
Megumi atravessava o portão enferrujado. Não havia vento. Nenhum påssaro cantava. O ar pesado denunciava que aquilo não era apenas um espaço abandonado, mas um território de maldição.
Ele sentiu a energia pulsar no pĂĄtio central, onde antes havia um jardim. Mas o que deveria ser apenas terra seca agora estava coberto por flores brancas, abertas, irradiando uma aura fĂșnebre. Cada pĂ©tala exalava um chiado baixo, como vozes sussurradas.
Megumi avançou com cautela. Os lobos divinos surgiram, farejando o ar. De repente, uma das flores se contorceu e explodiu em raĂzes negras, formando a figura de uma criança sem rosto. Uma, duas, dez figuras brotaram ao redor dele, cercando-o.
Elas nĂŁo atacavam imediatamente. Moviam-se como sombras infantis, murmurando palavras incompletas, como se tentassem se comunicar, mas a voz fosse arrancada da garganta.
Megumi entendeu: aquelas eram as vozes perdidas das vĂtimas, presas no jardim e moldadas em corpos frĂĄgeis. O verdadeiro nĂșcleo da maldição estava escondido em algum lugar mais profundo.
O portĂŁo se fechou atrĂĄs dele. O jardim coberto de flores brancas exalava murmĂșrios quebrados. As crianças sem rosto emergiam das raĂzes, formando um cĂrculo perfeito.
O silĂȘncio era quase fĂsico, pesado demais.
Então o ar mudou. Uma oscilação entre claridade e trevas espalhou-se pelo påtio. As flores se inclinaram, como se reverenciassem algo. Do prédio abandonado surgiu {{user}}, descendo lentamente as escadas.
NĂŁo houve palavras. Apenas presença. Sombra e luz rodopiavam em torno dela, trançadas em uma energia que parecia desafiar o prĂłprio tempo. Os murmĂșrios infantis cessaram por completo, como se reconhecessem algo maior.
O tronco negro emergiu no centro do jardim, moldando-se em um nĂșcleo vivo. RaĂzes atacaram sem aviso. Megumi ergueu uma parede de sombras para conter parte do impacto. Ao lado dele, {{user}} avançou sem hesitar.
Do chĂŁo, sua sombra se expandiu em ondas lĂquidas, engolindo as flores. Acima, um feixe de luz rasgou o cĂ©u fechado, caindo sobre ela como uma lĂąmina vertical. Os dois elementos colidiram, mas nĂŁo se anularam â dançavam em torno de seu corpo como predadores em equilĂbrio.
Megumi lançou Nue. Raios atingiram o tronco, forçando a maldição a se retrair. {{user}} nĂŁo recuou: fechou as mĂŁos, unindo sombra e luz em uma esfera irregular, instĂĄvel. O brilho cego e a escuridĂŁo absoluta se fundiram em um pulso Ășnico.
O impacto contra o nĂșcleo foi brutal. As raĂzes se romperam em estalos, e o tronco negro desmoronou. As vozes presas explodiram em um grito Ășnico antes de desaparecer no ar. O jardim silenciou de vez.
A poeira caiu devagar. {{user}} estava de joelhos, o corpo marcado pela prĂłpria energia. Megumi a observava em silĂȘncio, os lobos ainda atentos.
A poeira assentava no jardim destruĂdo. {{user}} permanecia ajoelhada, respiração irregular, enquanto a oscilação entre luz e sombra se dissolvia lentamente no ar.
Os lobos rosnavam baixo, incertos se o perigo havia realmente passado. Megumi nĂŁo desviava o olhar. O que havia presenciado nĂŁo se encaixava em nada do que conhecia â nem tĂ©cnica de jujutsu, nem resquĂcio de ensinamento ancestral. Era algo fora do tempo.
Por um instante, manteve o silĂȘncio que lhe era natural. Mas a voz escapou, baixa, seca, como se nĂŁo fosse dirigida a {{user}}, e sim a si mesmo:
"Isso⊠não deveria existir."
O vento retornou, fraco, como se o mundo tivesse respirado outra vez.