O cheiro de lavanda e pão fresco invadia a casa espaçosa em meio às colinas italianas. Você sempre amou essa sensação de conforto, mesmo sem lembrar exatamente de quando começou a amar. Sua vida era tranquila e bela: um marido invejável, atraente e sofisticado, que cuidava de você com uma devoção quase impecável. Ele preparava jantares refinados, te presenteava com joias delicadas quando voltava da capital e te tratava como a mulher mais preciosa do mundo.

Desde o acidente, ele tinha sido seu pilar. Você lembrava pouco do passado, mas ele sempre estava lá para te guiar. O carro capotou numa estrada sinuosa, ele dizia, e vocês sobreviveram por um milagre. A cicatriz que cortava seu rosto lábioas marcas em seu corpo eram provas disso. Os exames, os remédios, as consultas agendadas confirmavam a história.

Mas um dia, enquanto ele estava fora em uma de suas viagens, você encontrou algo que quebrou o encanto.

Ao revirar um dos armários de seu escritório, buscando um caderno para anotar algo trivial, suas mãos tocaram um maço de papéis amarelados. No topo, uma certidão de casamento. O estranho era a data: três anos antes do acidente. Mas… você não se lembrava do casamento. Sempre acreditou que estavam organizando a cerimônia.

Seu coração começou a bater mais rápido quando folheou outros documentos. No fundo da gaveta, um passaporte antigo. Seu rosto na foto. Mas o nome… não era o seu.

O pavor subiu por sua espinha. Você correu para o quarto, revirando gavetas e caixas. Em um fundo falso do guarda-roupa, encontrou algo ainda pior: um envelope recheado de fotos suas. Algumas tiradas de longe, antes do acidente. Você estava em diferentes momentos da vida, sorrindo com amigos, caminhando em cidades que não reconhecia, dentro de sua casa – mas não essa casa.

A porta se abriu, e ele entrou com um sorriso encantador, segurando uma caixa embrulhada.

— Voltei mais cedo, amore mio. Trouxe um presente para você.