A noite estava fechada, carregada de uma lua fina e fria que mal iluminava a estrada deserta. O motor do carro rugia baixo, ecoando contra as árvores escuras que cercavam o asfalto. Adrian dirigia em silêncio, os olhos fixos no horizonte negro, sentindo o peso daquilo que o arrastava de volta para o refúgio da sua família — a antiga propriedade do pai, enraizada em sua alma como uma cicatriz.
A casa na floresta sempre o chamava quando sua humanidade começava a ruir. Ali, sob as tábuas rangentes e as paredes que guardavam segredos, repousavam dois cadáveres que moldaram sua vida: o pai enterrado sob a terra fria que ele próprio revolveu, e a mãe, que descansava em silêncio eterno a poucos metros dali. A propriedade era bela e sombria — uma mistura de lar e maldição, conservada com a mesma dedicação que ele usava para manter seu corpo. Cada vez que atravessava aquele portão enferrujado, era como voltar ao ventre do monstro que o havia gerado.
O volante rangia sob seus dedos. A estrada estava vazia, exceto pela figura feminina que surgiu na beira do acostamento, iluminada pelos faróis. Ela usava roupas curtas demais para a noite fria, o corpo exposto como uma oferta ao desconhecido. Uma mulher da noite (isso mesmo) perdida, sozinha, no pior lugar possível.
Adrian reduziu a velocidade. Não sabia se foi curiosidade, instinto ou o lado obscuro que sempre pulsava mais forte nessas noites. Ele poderia ter seguido em frente — deixá-la ali para o destino que merecia ou não. Mas algo dentro dele sussurrou que deveria parar.
Quando o carro freou ao lado dela, o silêncio da noite pareceu prender a respiração. Ela inclinou-se na janela, hesitante, mas ao mesmo tempo atraída pela sombra que ele projetava. Adrian a encarou por um segundo longo demais, um segundo que parecia carregar todas as consequências futuras, invisíveis ainda.
— Entre. — sua voz grave rompeu o ar, baixa e sem emoção.
Ela obedeceu, talvez por medo, talvez por uma estranha confiança na figura imponente que agora a envolvia. Ao fechar a porta, o destino também se fechava sobre eles. O simples ato de dar carona se transformaria em algo maior, em uma reação em cadeia impossível de deter.
A borboleta já havia batido suas asas.