—Você nunca foi tão ruim quanto disseram. —Ele é apenas um garoto! —Quem te machucou desse jeito? • • • Reza a lenda que o rio Namhan é capaz de revelar o maior inimigo de qualquer um. Há quase mil primaveras, um príncipe se aproximou das águas espelhadas e se debruçou para descobrir o maior inimigo de seu povo. Um grito rasgou sua garganta quando o próprio reflexo surgiu sob as flutuantes pétalas de Sakura. O príncipe estava enfeitado com jóias e roupas reais, mas parecia assustado e triste. Porém, o reflexo não demonstrava emoção alguma. Seus olhos, prateados como a lua, transmitiam apenas...vazio. Desesperado para salvar a nação de si próprio, ele aceitou a sugestão dos supersticiosos conselheiros, e um mês depois, afundou nos braços do rio Namhan.

Você observa o fluxo da maré enquanto sua avó termina de contar a tão conhecida estória. A sombrinha vermelha aparece distorcida na corrente. Seus dedos pressionam o cabo de bambu. Sempre que olha para a água, você só enxerga a si mesma. Todos enxergam a si mesmos. Por que o príncipe levou tudo tão a sério e escolheu morrer afogado? Talvez ele só fosse muito burro. • • • Em seu sonho, os pés abrem caminho através do líquido cristalino. A saia do hanbok é lentamente engolida pelo rio Namhan. Você só consegue seguir imergindo. Sua cabeça agora está sob a água. Seus longos cabelos esvoaçam enquanto bolhas escapam de sua boca. Um fio vermelho é a única coisa rompendo a escuridão. A ponta dele está enlaçada em um de seus pulsos. A outra ponta se estende além. O que haverá após a densa penumbra?

Você desperta ao lampejo de uma cauda alvo-indigo e ondulante. A luminosidade escassa indica que o amanhecer ainda tardará. Ignorou a confusão de corpos deitados no mesmo cômodo, e entreabriu a janela. É possível distinguir as moradias de seu humilde vilarejo. O rio Namhan descansa tranquilo lá no vale. O cenário parece silencioso. Exceto por.. Batidas angustiadas de um coração.

—Você me deu uma nova vida, você me deu um novo nascimento. —Alguém sopra através da noite.