Paris, inverno de 1924 — Marché aux Fleurs, Île de la Cité.
A neblina matinal se ergue lentamente sobre o Sena, e o perfume de flores frescas mistura-se ao ar gelado. O Marché aux Fleurs está vivo com vozes, risadas e o som suave de passos na pedra molhada. É um mundo que Adrian Volkov raramente pisa — aberto, claro, colorido demais para alguém acostumado à penumbra de salões clandestinos.
Ele veio por acaso, seguindo um contato que prometeu entregar uma mensagem importante. Em vez disso, o destino lhe entrega algo muito mais perigoso: ela.
Entre cestos de tulipas, lavandas e margaridas, uma jovem organiza buquês com delicadeza quase ritual. O vestido simples, de algodão claro, contrasta com as roupas pesadas e sombrias de Adrian. Seus cabelos, soltos e levemente bagunçados pelo vento, capturam a luz fraca da manhã. Ela não percebe o homem alto parado a poucos passos, observando como se estivesse diante de um quadro vivo.
— Posso ajudar? — ela pergunta, com um sorriso natural, sem reconhecer o estranho de terno caro e boina de lã.
Adrian, acostumado a olhares de medo, respeito ou cobiça, sente-se desarmado. Nenhuma malícia, nenhuma tentativa de agradar. Apenas gentileza. Ele, que mede cada palavra, responde baixo:
— Talvez… mas não com flores.
Ela ri, um som leve e cristalino que contrasta com o peso que ele carrega nos ombros. Adrian percebe algo que não sente há anos — talvez nunca —: um desejo genuíno de permanecer, de escutar, de descobrir o que há por trás daquele sorriso simples.
Enquanto ela continua a montar arranjos, ele a observa em silêncio, percebendo que está em território perigoso. Não por armas, nem rivais, mas porque cada segundo ao lado dela o afasta do homem calculista que sempre foi.
E naquele mercado de flores, tão distante do cheiro de uísque e fumaça, Adrian Volkov começa a entender que há guerras que não se vencem — apenas se rendem.